sábado, 19 de março de 2011

MANIFESTAÇÕES DE CARINHO E APOIO



Abro um espaço entre uma postagem e outra para agradecer as várias manifestações de carinho que tenho recebido. As pessoas comentam o lado positivo do texto e demonstram apoio e solidariedade. Também recebi diversos  telefonemas e emails me dando força e esperança.
De minha esposa e grande companheira, Elzi, recebi um email que me emocionou. Como era extenso para ser incluído como comentário, resolvi colocá-lo como postagem. Trata-se de uma mensagem que fala sobre os desafios de quem está mais próximo do problema.  Só quem está ao lado, literalmente, sabe dimensionar as dificuldades vividas por quem sofre problemas de saúde. Sugiro a todos que possuem a graça de ter alguém assim, realmente junto, que valorizem essas pessoas e saibam agradecê-las. Estas, não estão doentes, mas  sofrem igual ou mais que o enfermo.

A você Elzi, muito obrigado por tudo.

Gilberto



                                                                                                                  Email recebido dia 15 Mar 2011
De: Elzi
Para: Gilberto
                       Gil:

       Lendo o texto em que conta sua experiência com a doença, me lembrei de tudo o que passamos nos últimos anos, em que ela acompanhou não somente você, mas toda nossa família.

       Sofremos muito. Nem mesmo sabíamos, naquela época, 1996, o que fazia um nefrologista. Soubemos pela pior forma. Além da terrível conseqüência do uso do medicamento – o desgaste no osso da perna, que na verdade foi o problema o que mais lhe trouxe dores – tivemos que enfrentar o fato de que a doença era irreversível.

       Não vou me esquecer nunca da imagem do Arthur, com apenas seis anos, em 1998, de máscara, dormindo enquanto esperava você fazer a diálise peritoneal, que exigia cuidados radicais com higiene.

       Lembro-me da longa espera pelo transplante, das vezes em que nos enchemos de esperança pela possibilidade de um rim compatível e da decepção da negativa. De sua tristeza e frustração por ter que deixar um trabalho do qual gostava tanto.

       Lembro-me também da sua coragem ao construir nossa casa, alternando quatro sessões de diálise peritoneal com o cansativo trabalho de planejar e acompanhar cada detalhe da construção.

       Lembro-me da exaustiva espera, de mais de 07 horas, na porta da sala de cirurgia, quando finalmente pôde ser feito o transplante. Da vigília na porta do CTI, das orações, de madrugada, para que o novo rim funcionasse. E da alegria quando isso aconteceu.

       O período de tranqüilidade que se sucedeu foi cheio de realizações, quando pudemos trazer ao mundo essa criança iluminada que é o Lucas, quando você pôde se aperfeiçoar na fotografia e fazer o trabalho que tanto lhe trouxe realização pessoal.

       Tranqüilidade perturbada pela notícia do câncer no rim, em 2005, com outra espera, desta vez de mais de 09 horas de cirurgia, além das complicações posteriores.

       Em 2008, a notícia da volta do câncer, já com metástases. Nova cirurgia, nova espera, novos sofrimentos. A informação de que não havia tratamento para este tipo de câncer “tirou nosso chão”, obrigando-o a abandonar outro trabalho pelo qual era verdadeiramente apaixonado.

       Não querendo acreditar na terrível afirmação, buscamos, em longas viagens, a esperança de uma cura que parecia cada vez mais distante.

       Depois de outras cirurgias realizadas ( algumas canceladas dentro do próprio centro cirúrgico, após toda a angústia da preparação para cada uma delas) nova esperança com o medicamento que conseguimos através da Justiça. Novo sofrimento com os gravíssimos efeitos colaterais.

       Nem vou me ater às diversas internações, por causa das tromboses, com as dores e dificuldades que acarretam.

       Um dos piores momentos foi quando, há um ano, você foi para Belo Horizonte, praticamente em coma, com os piores prognósticos e praticamente sem nenhuma esperança. Não foi possível evitar a conversa com o Lucas, tentando fazê-lo entender que o pai provavelmente não voltaria. Mas, como fazer uma criança entender que o pai não vai voltar?

       Tão triste quanto isso era ver, na cabeceira de sua cama, no hospital, a passagem para a viagem com que você tanto sonhou, marcada para aquela mesma semana.

       Mas você voltou. Contra todas as expectativas mais sombrias, você voltou. E plantou árvores e flores. E começou a estudar de novo, acreditando que ainda poderia realizar seu sonho de concluir um curso superior.

       Às vezes, rimos quando os médicos não entendem como você, com exames tão ruins ( como por exemplo uma creatinina em um nível em que muitos já fazem hemodiálise), diz que se sente bem. E que quer comer pão com mortadela .

       Entre uma trombose e outra, uma febre e outra, consegue fazer planos, blogs, vestibulares... Às vezes, até para mim é difícil entender como você consegue abstrair da situação, e sonhar.

       Optamos por viver um dia de cada vez. Às vezes rimos da situação, fazemos brincadeiras. Mas choramos muito. Choramos juntos, choramos sozinhos, choramos escondido. Porém, apesar de todas as renúncias e dificuldades, temos que limpar as lágrimas e continuar a luta, tentando fazer a vida de nossos filhos a mais normal possível.

       O certo é que todo esse sofrimento nos fez ser pessoas melhores. Talvez, sem ele, nossas vidas teriam tomado rumos diferentes. O sofrimento nos obriga a buscar algo maior em que acreditar, tentando aceitar que para tudo existe um propósito. A convivência freqüente, em hospitais, com pessoas que passam por sofrimentos ainda maiores – inclusive crianças - nos faz ver que ainda temos sorte. A solidariedade dos verdadeiros amigos nos mostra que ainda vale a pena acreditar no mundo e nas pessoas.

       Que venha o que tiver que vir, Gil. Estaremos juntos.

       Um beijo.

       Elzi


Abraços a todos e sejam felizes!

Gilberto



quarta-feira, 9 de março de 2011

BENDITO CANCER QUE ME ACOMPANHA




PARTE I


Calma! Eu explico.

Sempre fui feliz. Muito feliz. Eu não sou daqueles que dizem: “eu era feliz e não sabia”. Eu não; eu sabia que era feliz e tinha consciência dessa alegria. Apesar de pobre, tive uma infância maravilhosa e vivi uma adolescência contagiante. Aos sons das discotecas me divertia nos embalos de sábado à noite, e já na fase adulta obtive razoável sucesso profissional, ainda que não possuísse formação Acadêmica.

Atualmente sou mais feliz que antes, porque hoje tenho um pouquinho mais de compreensão das coisas da vida. Hoje eu tenho noção do que seja o caminho que o Evangelho prega. Se ando nele ou não, vai depender só do meu arbítrio.

Tenho certeza de que muitos dos que estão lendo podem estar pensando: grande coisa, saber o que é certo e errado eu também sei, difícil é andar no caminho certo. Eu também pensava assim. Entretanto, depois de superar e ainda enfrentar alguns obstáculos na vida, eu passei a ter uma visão mais cristalina dos caminhos e dos valores do nosso mundo.

As enfermidades deram início a essa  mudança de visão. Tudo começou com o tal razoável sucesso profissional: Muitas farras, churrascos e tira gosto com pimenta e muito sal. Claro que tudo isso regado a muita cerveja. Como a pressão arterial tem um comportamento silencioso, ela se portou da mesma maneira comigo. Não me avisou em nenhum momento sua pré-disposição em subir.

Além disso, acho que meu organismo tinha uma tendência a problemas renais. A partir daí, meus problemas de saúde se inciaram. A pressão alta atacava os rins e os rins, por sua vez, faziam a pressão subir, porque estes estavam trabalhando sob pressão. Só a partir dessa época é que comecei a tratar o problema da hipertensão. Controlei a pressão com medicamentos, mas não deu para salvar os rins. Resultado: dois anos de hemodiálise.

Antes da hemodiálise, foi indicada, como última esperança para salvar meus rins, uma dosagem mais elevada de corticóides. Porém, não adiantou. Por causa dessa dose cavalar de corticóides, desenvolveu-se em minha perna esquerda uma necrose (desgaste) na cabeça do fêmur. Este é o motivo da minha manqueira. Gostaria de deixar claro que este diagnóstico foi feito por outro médico no início do meu tratamento. Depois deste episódio, na parte da Nefrologia, estou sendo muito bem atendido pelo Dr João Batista Moreira e sua equipe. Ele, além de médico,  é  Anjo da Guarda. Quanto ao antigo médico, nunca tive nenhum tipo de ressentimento ou mágoa. Acho que ele não teve culpa.

Depois da hemodiálise e após exaustivos exames de compatibilidade, graças à generosidade do meu irmão Gerson, fiz um transplante renal que está durando  mais de dez anos. Para que se mantenha o transplante no dia a dia, é necessário que o transplantado tome drogas contra rejeição. Isto faz com que o organismo diminua sua proteção contra os agentes externos, tornando-o  mais susceptível a doenças e infecções. Assim, aconteceu comigo também. Instalou-se em mim um tal Carcinoma de células claras de rim, diagnosticado inicialmente em 2005. Meu rim direito foi extraído e fiquei bem por algum tempo.

Porém, o câncer voltou em 2008. Fui então orientado a procurar um Oncologista para orientações. Divinópolis era o centro oncológico mais indicado, porque quando fosse a época das quimioterapias eu estaria mais perto de casa. Mas as coisas não aconteceram bem assim. Foi num consultório frio, com um barulho irritante de uma marreta que quebrava paredes em construção ao lado, que eu ouvi sozinho as explicações da médica tentando ser doce e sutil. Resumindo, ela me disse que eu portava um tipo de câncer contra o qual  infelizmente os tratamentos de quimioterapia e radioterapia não eram eficazes, ou seja os tratamentos tradicionais não adiantavam para este tipo de câncer. Até nesta data não existe tratamento para essa casta.

Como ela foi muito cuidadosa comigo, aceitei o problema e saí de lá bem equilibrado. Entretanto, confesso que ao entrar no meu carro e dar a notícia à minha esposa pelo telefone, eu desabei em choro. Dentro de alguns minutos enxuguei as lágrimas, mas continuei chateado. Hoje em dia, lido com isso sem problemas, pois tenho muito apoio da família, amigos e da querida Dra. Letícia, que juntamente com sua equipe (hospital Felício Rocho) cuida para que eu tenha uma melhor qualidade de vida. Claro que tem aqueles dias em que a gente “amarra uns bodes”, mas acho isso normal, acontece com todo mundo. Agora, depressão não, tô fora. Não tenho nenhuma inclinação e nem motivo pra ficar de ovo virado um, dois, sabe lá quantos dias.

Depois de um tempo me consultando em Divinópolis, fui em Barretos várias vezes, em  jornadas extremamente cansativas, buscando uma solução que não veio. Voltei para Belo Horizonte, fiz mais cirurgias, marcaram outras tantas que não puderam se realizar. Receitaram-me um medicamento que custa mais de R$ 20.000,00. Entrei na Justiça, consegui o tratamento. Porém, os efeitos colaterais foram muito graves e os médicos tiveram que suspender a medicação.

Por outro lado,  o problema do desgaste no fêmur me impede de exercícios com as pernas. Até o ato de simplesmente caminhar é problemático pra mim. Ademais, quem tem problemas de câncer, tem uma tendência a ter incidências vasculares. E para completar, pequenas arritmias cardíacas ajudam a provocar quadros de Trombose. Como possuo todas estas três características, já sofri cinco. Acho que sou recordista neste quesito.

Não vou me estender relatando  cirurgias a que  me submeti (todas com anestesia geral), bem como complicações pós cirúrgicas. Nem mesmo sobre a Dengue , em março de 2010, que fez meu corpo virar um molambo e, nos poucos momentos de lucidez, sentir a mais profunda fragilidade que um ser humano pode sentir. Vegetei por alguns dias no hospital.

Depois da dengue, tive mais duas tromboses. Minha última internação foi no final de fevereiro passado. Ainda estou com a perna muito, muito inchada e as dores são difíceis de suportar.

Há, segundo os médicos, metástases no pulmão e vários nódulos. Mas estou relativamente bem, na maior parte do tempo.
Caros seguidores, relatei o que se passa comigo por vários motivos: Primeiro porque gosto de falar pra todo mundo o que está acontecendo comigo. Desde o início, sempre falei tudo que me acontece, quando  tenho oportunidade. Agora, registrando aqui, mais pessoas saberão. Isto é ótimo, pois é mais oração pra mim. Segundo, acho que esta leitura pode ajudar alguém de alguma forma. Terceiro, era necessário fazer uma descrição desse período, para dar lastro ao restante do texto.

Meus amigos, apesar de ter tentado ao máximo reduzir a história, o texto está ficando longo e fiquei cansado. Vou ter que explicar minha boa relação com as enfermidades na próxima postagem.

Abraços a todos,

Gilberto Lobato

Ps. Este Blog continua sendo focado em fotografia. Em breve retornaremos com material novo e atualizado.
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